domingo, 22 de março de 2015

Vaqueiros ganham até cinco salários extras trabalhando em hotel para bois

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No vai e vem acelerado dos peões, o dia parece pequeno. Assim é a rotina de quem vive na fazenda. E a imensidão de terra não pode mais ser chamada de lugar isolado. A roça não parou no tempo.
É uma mistura de vida pacata com o mundo moderno. Em um “boitel” - uma espécie de hotel fazenda para bois de engorda, o ganho de peso do animal é controlado por computador. E surgiram novas palavras que pareciam distantes do mundo rural.
“Fazemos a coleta através do leitor usb. Aí, no bluetooth ele cai no computador”, explica o vaqueiro Wanderson Pacheco.
O que o Wanderson quis dizer é que todas as informações - da raça até a idade do boi, vão direto para o computador, sem precisar de papel e caneta.
“Aí, era bem mais difícil, era manual, bem mais trabalhoso, acontecia muito mais erros. Aqui praticamente o erro é zero”, conta o vaqueiro.
Agora, aumentaram as ferramentas de trabalho.
Globo Repórter: O que o Wanderson carrega não é só o canivete não. Também tem um celular, o rádio, e atrás mais um celular. Os dois são da empresa, para falar com o chefe.
“Eu tirei umas fotos, enviei para um parceiro que é o dono dos bois, comunicando ele que aqui tem 50 animais prontos para o abate. Um vaqueiro para população é rústico. Hoje um vaqueiro tem praticamente o mesmo conhecimento de uma pessoa que mora na cidade, através da tecnologia que tá tendo no campo”, conta Wanderson.
Na hora do intervalo deles está todo mundo no curral com o celular na mão.
Wanderson e os amigos são vaqueiros. A profissão é antiga, mas só há pouco mais de um ano foi regulamentada no Brasil.
Na fazenda além de todos os direitos garantidos a um trabalhador com carteira assinada, o Wanderson e os colegas têm uma motivação a mais: eles enxergam no horizonte a possibilidade de ganhar salários extras. Um tipo de benefício que nem todas as empresas da cidade oferecem.
Imagine ganhar até cinco salários extras. Wanderson e os colegas recebem até 18 salários por ano. Mas para isso precisam cumprir metas. O salário engorda se o boi ganhar peso dentro do prazo previsto.
“Se você for jogar nos salários, dá para tirar de R$ 300 a R$ 500 por mês. Se você for jogar em média”, conta o vaqueiro Wanderson Pacheco.
“Na nossa região, os melhores salários são para quem está começando são no campo. Se ele conseguiu chegar nos 18 salários é porque ele fez um trabalho espetacular e ele merece compartilhar do resultado”, diz o empresário rural Pedro Merola.
Mas é preciso ter experiência. Não dá para ser vaqueiro de um dia para o outro. No interior do Brasil é profissão que atravessa gerações.
O Wanderson trabalha junto com o pai, Seu Benedito, que confessa: ultimamente ele tem deixado de lado o papel de professor.
“Eu estou sendo aluno. Hoje ele que está me ensinando. Me ensina uma parte de computador, digitar. Me ensina a lidar mais com calma. No meu tempo tinha muito mais ignorância”, conta Benedito Araújo.
Nova realidade dos vaqueiros contrasta com as antigas histórias
Os tempos são outros: se precisar de uma corridinha até o curral, o cavalo continua sendo o principal meio de transporte. Mas não estranhe se aparecer um vaqueiro motorizado.
“Eu ia para cidade, fazer compra para passar o mês, eu ia de charrete! Hoje não, hoje tem o carro próprio”, relembra Seu Benedito.
Arrependimento pelo filho ter ficado no campo? Nenhum.
“Há 15, 20 anos atrás, eu ia falar: ‘vamos levar meu filho para cidade. Meu filho aqui tá ficando um roceiro, um bichinho do mato’. Agora não. Hoje não. Hoje eu tenho orgulho”, comenta Seu Benedito.
E é ali que Wanderson quer realizar sonhos. O vaqueiro está casado há oito meses com Isabela, que está grávida. Por amor, Isabela trocou a cidade pelo campo.
“Se falar pra mim trocar a fazenda para ir pra cidade eu não troco não. Eu me sinto mais segura aqui, porque na cidade, sei lá, a violência tá maior, ne? Agora aqui não, dorme de porta aberta, não tem perigo nenhum”, diz a esposa Wanderson, Isabela Lorrane Araújo.
A casa é pequena, mas tem TV via satélite e internet. A internet também será usada agora para mandar fotos da gravidez para os parentes.
Nos planos do jovem vaqueiro está uma faculdade. Ele sabe que precisa ir mais longe para atender às necessidades da fazenda e para conquistar um futuro ainda melhor. Novos caminhos. Sem deixar a terra onde nasceu, Wanderson encontrou uma nova realidade. (Globo Repórter)

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